O trabalho é um
órgão que pulsa
No corpo-humanidade,
É o pulso
descompassado
Da velha modernidade
É o pão amassado com
o suor,
Pela mão pequena da
criança, pela mão enrugada do idoso,
Sem infância, sem
descanso
É a ciranda
dos Direitos do Homem,
Direitos de fumaça,
Miragens que se
dispersam no ar pesado da realidade
O trabalho é a fonte
fresca de água doce que deságua no mar salgado,
Vidas que se perdem
buscando o sustento,
Vidas que se
secam no
deserto
das fantasias alheias
O trabalho é o
combustível que alimenta o motor-sociedade
É liberdade vestida
de prisão e travestida de fantasia de liberdade
O trabalho é uma
posição na pirâmide-sociedade:
Homens-alicerce,
homens-base, homens-médios, homens-ponta
E assim a
humanidade é pintada
como uma multidão organizada
que progride,
Desde
que a parte de
baixo
não se mova,
E não
dance ao som dos
próprios anseios
É
difícil sustentar
o peso de tantas vidas humanas,
Mas o medo
faz parecer legítimo aquilo que não é,
E a razão engole
seco e se convence de que
não existe outro meio,
E se
cala, se
cala, se
cala
Trabalho também pode
ser realização, projeto, sonho,
Pode
ser
a construção de si mesmo,
Não apenas o
sustento do tão incógnito mercado,
Que
deixa sempre
um gosto amargo na boca daqueles que
Trabalham,
trabalham, trabalham.
A
roda do tempo
gira,
Mas
a engenhosidade
humana não se cansa
de trabalhar
Para
gerar
novas formas de servidão
É estranho
nascer
livre neste
lugar
E
ao crescer ter
a certeza de que deve
algo
Àqueles que se declaram
os legítimos proprietários de quase tudo o
que existe,
É engraçado saber
que todos nascem
filhos da Terra,
E passam
a vida a lutar para serem bons
inquilinos
O
trabalho é o salão onde
caem as máscaras,
E ficam evidentes as
contradições mais profundas da nossa adorada humanidade,
Seus vergonhosos
abusos e sua genialidade dourada,
É o campo de testes
dos ideais, é o palco das ambições, é o metro das capacidades
É onde deixamos bem
claro, como homens, que cada indivíduo pode ter um preço,
Que a sua vida pode
ser comprada aos pedaços,
Que
com os pedaços que sobram é possível comprar
algumas coisas,
Mas não é
possível comprar um sentido para a própria história,
Pura
vertigem,
Roda, roda,
roda.
Mariangela Ragassi
07.05.2010